A suspensão da prescrição de pretensão indenizatória só ocorre quando há relação de prejudicialidade entre as esferas cível e criminal. Para tanto, é fundamental que exista processo penal em curso ou, pelo menos, a tramitação de inquérito policial. Esse foi o entendimento da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que acatou Recurso Especial da Sul América Companhia Nacional de Seguros.
O caso refere-se a um acidente ocorrido em agosto de 2002, na cidade de Várzea Grande (MT), quando uma carreta pertencente à Transportadora Solasol colidiu com um motociclista. Em fevereiro de 2006, o condutor da motocicleta ajuizou ação de indenização para a reparação de danos morais e estéticos sofridos.
Em primeira instância, o juiz reconheceu a ocorrência da prescrição prevista no artigo 206, parágrafo 3º, inciso V, do Código Civil de 2002. De acordo com o dispositivo, a pretensão de reparação civil prescreve em três anos. A contagem do prazo trienal começou a correr a partir da entrada em vigor do Código Civil, em janeiro de 2003, visto que o incidente aconteceu em data anterior.
A vítima do acidente apelou ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso, que deu provimento ao recurso e afastou o reconhecimento da prescrição. O TJ-MT se baseou no artigo 200 do CC, segundo o qual, “quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva”. Em seu entendimento, o prazo prescricional da pretensão indenizatória não havia sequer iniciado, já que não havia ação penal no caso.
Independência relativa - A Sul América, seguradora contratada pela transportadora, então, interpôs Recurso Especial no STJ. Pediu que a decisão de segunda instância fosse reformada. O ministro Paulo de Tarso Sanseverino, relator do caso, acatou o recurso por entender que o tribunal não deveria ter aplicado a regra prevista no artigo 200 do CC. Sanseverino observou a “inexistência de relação de prejudicialidade entre as esferas cível e criminal”, pois não foi instaurado inquérito policial ou iniciada ação penal.
O ministro explicou que o artigo deve ser interpretado de acordo com o princípio da independência relativa entre os juízos cível e criminal, consagrado pelo artigo 935 do CC. “A independência entre os juízos cível e criminal é apenas relativa, pois existem situações em que a decisão proferida na esfera criminal pode interferir diretamente na decisão proferida no juízo cível, fazendo neste, aliás, coisa julgada”, afirmou.
Sanseverino citou também a regra do artigo 63 do Código de Processo Penal, que segue a mesma linha. De acordo com o dispositivo, caso haja sentença condenatória transitada em julgado, o ofendido, seu representante ou os herdeiros poderão promover a execução, na Justiça, da reparação do dano sofrido.
Por fim, o relator lembrou que a lesão corporal culposa — produzida pelo acidente de que trata o processo — constitui infração de menor potencial ofensivo, com pena máxima de dois anos, e depende de representação do ofendido para abertura de ação penal, cujo prazo decadencial é de seis meses. “Consequentemente, não havendo qualquer notícia no processo dessa representação, cujo prazo decadencial já transcorreu, não se mostra possível a aplicação da regra do artigo 200 do CC”, concluiu.
Como a verificação das circunstâncias fáticas não era prejudicial à ação indenizatória e, além disso, não houve representação do ofendido, o relator entendeu que não ocorreu a suspensão da prescrição prevista no artigo 200. A 3ª Turma, em decisão unânime, acatou o Recurso Especial para restabelecer a sentença integralmente. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ. (
Recurso Especial 1180237)
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